quinta-feira, 10 de maio de 2018

Viação Theresopolina


ESTATUTOS DA COMPANHIA UNIÃO THERESOPOLINA

Decreto  Nº 1.464 - de 25 de Outubro de 1854, approva os Estatutos da Companhia denominada - União Theresopolina.

"Attendendo ao que Me representou a Directoria da Companhia denominada - União Theresopolina -; e conformando-Me com o parecer da Secção do Conselho d'Estado dos Negocios do Imperio exarado em Consulta de 23 de Agosto: Hei por bem Approvar os Estatutos da referida Companhia que com este baixão assignados por Luiz Pedreira do Coutto Ferraz, do Meu Conselho, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Imperio, que assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte cinco de Outubro de mil oitocentos cincoenta e quatro, trigesimo terceiro da Independencia e do Imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Luiz Pedreira do Coutto Ferraz.

Estatutos da Companhia - União Theresopolina -, a que se refere o Decreto desta data

TITULO I

Do objecto e duração da Companhia

Art. 1º A Associação anonima, instituida sob a denominação de Companhia - União Theresopolina -, installada nesta Côrte, tem por objecto a industria de transportes de passageiros e mercadorias, feitos diariamente entre a Cidade do Rio de Janeiro e o Porto da Piedade por meio de barcos de vapor, faluas, &c., e em continuação daquelle porto até a raiz da serra dos Orgãos por meio de carros de quatro rodas, tirados por animaes; e vice versa.

Art. 2º Estando os interesses da Companhia ligados aos dos lavradores, se formará na raiz da serra dos Orgãos, em lugar apropriado para a estação de seus vehiculos, hum estabelecimento mercantil abastecido de generos do principal consumo e de difficil deterioração, como sal, algodão e ferro.

Art. 3º A Companhia durará por vinte annos contados desta data, salvo os casos de dissolução previstos abaixo.

Este periodo poderá ser prorogado pelo tempo que convier aos Accionistas, por deliberação tomada em Assembléa Geral para isso expressa e extraordinariamente convocada dous annos antes da expiração daquelle prazo, e com approvação do Governo Imperial.

TITULO II

Do Capital

Art. 4º O capital da Companhia he fixado em quatrocentos contos de réis, divididos em duas mil acções de duzentos mil réis cada huma, as quaes serão assignadas pelo Presidente e Secretario da Directoria.

Este capital poderá ser augmentado, se no futuro convier, por deliberação tomada em Assembléa Geral.

Art. 5º As prestações serão feitas, sempre que a Directoria julgar conveniente, na razão, cada huma, de dez por cento sobre o capital.

O intervallo de huma prestação á outra nunca será menor de dous mezes, e o prazo para sua realisação será de trinta dias peremptorios, contados dos annuncios nas folhas de maior circulação.

Exceptua-se a primeira prestação, que será realisada dentro de dez dias contados da mesma fórma.

Art. 6º Os Accionistas, que não realisarem a primeira prestação, e os que faltarem ao pagamento das subsequentes nos prazos referidos, perderão o direito ás suas acções, revertendo estas no primeiro caso, e no segundo caso os valores realisados, em beneficio da Companhia, que disporá das acções como convier.

Exceptua-se o caso de força maior provado dentro de trinta dias, contados daquelle em que se devia realisar a prestação, perante a Directoria, que resolverá como entender de justiça e equidade.

Art. 7º Os Accionistas respondem somente até o valor de suas acções na fórma do Art. 298 do Codigo Commercial, e podem doar, hypothecar e alienar as referidas acções, guardando no primeiro e ultimo caso o disposto no Artigo seguinte.

Art. 8º A transmissão das acções se opera por via de transferencia lavrada por termo no livro respectivo, á vista das acções, e presentes os contrahentes, que deverão assignar juntamente com o Director que servir de Secretario da Directoria.

TITULO III

Da Directoria

Art. 9º A Companhia he administrada por huma Directoria de tres Membros nomeados na fórma do Art. 28.

Para fazer parte da Directoria he mister ser Accionista pelo menos de trinta acções, as quaes serão inalienaveis durante o tempo de suas funcções.

Art. 10. Os Membros da Directoria, cujo impedimento exceder a hum mez, serão substituidos na fórma do Art. 12 por Supplentes nomeados na fórma do Art. 34.

Para ser Supplente he mister ser Accionista pelo menos de vinte acções, que serão inalienaveis em quanto durar o seu cargo.

Art. 11. A Directoria se renovará annualmente na proporção de hum terço, designando a sorte nos primeiros annos o Membro que tem de sahir.

A nomeação dos Supplentes he annua. Os mesmos Membros podem ser reeleitos.

Art. 12. A Directoria he solidaria; seus Membros escolherão d'entre si o Presidente, Secretario e Thesoureiro.

O Secretario substituirá o Presidente; o Thesoureiro e Secretario serão substituidos pelos Supplentes que o Presidente designar; e esgotada a lista destes, pelos Accionistas que ao Presidente merecerem mais confiança, mas que sempre deverão possuir pelo menos vinte acções, até a reunião da Assembléa Geral, que deliberará o que convier.

Art. 13. Compete á Directoria:

§ 1º Organisar o Regimento interno, marcar os preços dos transportes, augmental-os ou diminuil-os segundo o interesse da Companhia, taxar os vencimentos dos empregados, bem como as fianças que deverão prestar.

§ 2º Nomear e demittir livremente o Gerente da Companhia, e tomar-lhe contas mensalmente.

§ 3º Fazer registrar no Tribunal do Commercio os presentes Estatutos.

§ 4º Convocar a Assembléa Geral nos casos e na fórma dos Artigos 23 e 27.

§ 5º Promover em geral tudo quanto entender a bem dos interesses da Companhia.

Art. 14. A Directoria se reunirá pelo menos huma vez todos os mezes para deliberar o que convier.

Art. 15. As ordens, correspondencias e resoluções serão assignadas pelo Presidente e Secretario, e registradas em livro proprio.

Art. 16. A Directoria he obrigada a publicar nos primeiros dez dias de cada mez hum balancete da receita e despeza do mez anterior com a devida clareza.

Nas reuniões ordinarias da Assembléa Geral, que terão lugar annualmente, a Directoria apresentará hum balanço geral do activo e passivo da Companhia, e hum relatorio circunstanciado dos factos occorridos na sua marcha durante o anno precedente.

Art. 17. Em remuneração do trabalho e responsabilidade inherente aos Directores, a Directoria perceberá huma Commissão de cinco por cento dos lucros liquidos, que serão distribuidos pelos seus Membros e pelos Supplentes, na proporção do tempo que tiverem servido.

TITULO IV

Do Gerente

Art. 18. O Gerente he nomeado e demittido livremente pela Directoria, que apresentará á Assembléa Geral as razões que houverem motivado a demissão.

Para ser Gerente he necessario ou possuir cincoenta acções inalienaveis durante o exercicio de suas funcções, ou prestar fiança idonea de dez contos de réis.

Art. 19. Ao Gerente compete:

§ 1º Nomear e demittir livremente os empregados sob sua direcção, de cujos actos he responsavel.

§ 2º Administrar o estabelecimento commercial da raiz da serra dos Orgãos e do porto da Piedade, as estações intermedias, e todo o mais serviço de transportes de mar e de terra, com todas as suas dependencias.

Para esta administração a Companhia lhe concede os poderes necessarios em direito, salvas as limitações consignadas nestes Estatutos.

Art. 20. O Gerente he obrigado ao seguinte:

§ 1º Executar as deliberações e ordens da Directoria, prestando todos os serviços que ella exigir com relação ao objecto da Companhia.

§ 2º Prestar á Directoria hum balancete mensal pelo modelo que ella organisar, entregando ao Thesoureiro os saldos do mez antecedente.

§ 3º Residir nos lugares das estações que lhe forem designados, sob sua responsabilidade.

Art. 21. O Gerente, quando assignar a correspondencia ou quaesquer actos relativos á sua gerencia, deverá declarar que o faz como Gerente da Companhia.

Nos casos porêm de letras ou titulos de credito deverá consultar precizamente a Directoria.

Todo o acto, assignado pelo Gerente sem a declaração supra, não acarreta a responsabilidade da Companhia para com terceiros.

O Gerente não deve empregar-se em ramo algum de negocio, nem distrahir sua acção para objectos alheios á Companhia.

Art. 22. Os vencimentos do Gerente consistirão em huma porcentagem nunca menor de cinco por cento sobre os lucros liquidos em cada anno.

No caso de ser insufficiente aquella porcentagem em relação aos trabalhos do Gerente, poderá este perceber huma gratificação, cuja apreciação e iniciativa competirá á Commissão de contas, com approvação da Assembléa Geral.

TITULO V

Da Assembléa Geral

Art. 23. A reunião dos Accionistas, convocados por tres annuncios consecutivos de ordem da Directoria nas folhas de maior circulação, constitue a Assembléa Geral.

Art. 24. Para que possa constituir-se a Assembléa Geral, requer-se que estejão presentes tantos Accionistas, quantos representem hum terço do capital effectivo da Companhia em relação aos Accionistas que tem voto; e para te-lo he precizo possuir cinco acções. Os Accionistas, que não tiverem este numero, poderão discutir, mais não votar, excepto se tiverem procuração de outro ou outros, cujas acções reunidas completem o numero prescripto.

Art. 25. Se no dia designado não houver numero para constituir Assembléa Geral, se fará nova convocação della, observada a disposição do Art. 23; e nesta reunião, que terá lugar dentro de dez a quinze dias da data dos annuncios, se deliberará com os votos presentes, qualquer que seja o seu numero.

Art. 26. As deliberações, que se houver de tomar ácerca do disposto nos Arts. 3º e 4º, só serão validas votando Accionistas que representem a maioria absoluta do capital da Companhia.

Art. 27. A Assembléa Geral se reune ordinariamente nos primeiros quinze dias do mez de Julho de cada anno, e quando a Commissão de contas houver concluido o seu trabalho.

Fóra destes casos a Assembléa Geral se reunirá extraordinariamente quando a Directoria julgar conveniente convoca-la, ou quando essa convocação lhe for pedida por Accionistas que representem o terço do capital effectivo; neste ultimo caso se oito dias depois do pedido a Directoria não houver feito a convocação, ella poderá ser feita por aquelles Accionistas, que deverão assignar-se declarando o numero de acções de cada hum.

Nestas reuniões extraordinarias se tratará unicamente do objecto que deo lugar á convocação; todavia se receberá qualquer indicação, que será reservada para ser tomada em consideração nas Sessões ordinarias.

Art. 28. A Assembléa Geral elegerá annualmente por escrutinio secreto, e á maioria relativa de votos hum Presidente, 1º e 2º Secretario, os quaes substituirão aquelle nos seus impedimentos, na ordem indicada. Esta votação será feita em huma só lista.

Não poderá fazer parte da Mesa nenhum dos Accionistas que for Director, Supplente ou Gerente.

Art. 29. Ao Presidente compete:

§ 1º Abrir e fechar a Sessão.

§ 2º Manter a boa ordem e regularidade das discussões. Nunca consentirá que hum Accionista falle mais de duas vezes sobre o mesmo assumpto, nem ainda para explicar.

Exceptuão-se os Membros da Directoria, e os das Commissões encarregadas de qualquer trabalho, que poderão responder ás questões que lhes forem dirigidas.

Art. 30. Pertence aos Secretarios fazer a chamada e verificar o numero dos Accionistas presentes em Assembléa Geral; contar os votos de cada hum na proporção de suas acções; fazer a apuração das votações, redigir as actas; ler o expediente, e o mais que o Presidente ordenar; e escrever a correspondencia, que será assignada pelo Presidente e 1º Secretario.

Art. 31. Nas votações por escrutinio secreto hum dos Secretarios procederá á chamada pela lista dos Accionistas, dos quaes receberá as cedulas, contendo no verso o numero de votos correspondente ás acções que possuirem e representarem, e fazendo logo a devida conferencia, as lançará na urna.

Art. 32. Na primeira reunião da Assembléa Geral, depois de lido o relatorio da Directoria, se procederá á eleição de huma Commissão de tres Membros na fórma do Art. 28, para exame do balanço e operações.

A esta Commissão serão franqueados todos os livros, documentos e esclarecimentos que ella exigir.

Art. 33. Nas Sessões, em que for lido o parecer ou relatorio da Commissão de exame, poderão os Accionistas exigir os esclarecimentos que lhes parecer na fórma do Art. 290 do Codigo Commercial.

Art. 34. Na Sessão, em que for apresentado o parecer da Commissão, terá lugar a eleição da Directoria na proporção de hum terço, e em seguida a de tres Supplentes, tudo na fórma prescripta no Art. 28.

Art. 35. Os votos dos Accionistas em Assembléa Geral serão contados do modo seguinte:


De 5 até 10 acções 1 voto 
De 11 a 20 « 2 
De 21 a 30 « 3 

e assim por diante até dez votos, que he o maximo, qualquer que seja o numero das acções que representem.

Esta regra se observará tomando englobadamente as acções do Accionista impedido com as do que o representar em virtude de procuração bastante.

TITULO VI

Dos dividendos, fundos de reserva, e reserva para o depreciamento do material

Art. 36. Nos mezes de Junho e Dezembro de cada anno a Directoria, verificado por balanço o estado da Companhia, deliberará se ha lugar a distribuição de dividendos pelos Accionistas, e conseguintemente fixará a sua importancia.

Art. 37. Formarão dividendo os fundos liquidos realisados durante o semestre, deduzidas as Commissões á Directoria e Gerente, fundo de reserva, e reserva para o depreciamento do material.

Art. 38. Formarão fundo de reserva dez por cento dos lucros liquidos em cada semestre, e bem assim os beneficios que resultarem á Companhia nos casos previstos no Art. 6º.

O fundo de reserva será collocado a render em hum Banco desta Cidade, e seus juros reverterão para augmento dos dividendos nos semestres respectivos.

Art. 39. Para fazer face ao depreciamento do material, se reservarão todos os annos dous por cento sobre o capital effectivo da Companhia, os quaes serão sempre constantes e collocados a render em hum Banco desta Cidade.

Os juros que produzir serão accumulados sem distracção para augmento dos dividendos.

Art. 40. Quando o fundo de reserva se elevar a hum terço do capital effectivo, poderá a reserva semestral ser reduzida a seis ou cinco por cento dos lucros liquidos, revertendo o excesso para augmento dos dividendos.

TITULO VII

Da dissolução e liquidação

Art. 41. A dissolução da Companhia terá lugar nos casos marcados no Artigo 295 do Codigo Commercial.

Art. 42. Se a dissolução tiver lugar antes de expirado o prazo de vinte annos marcado para a duração da Companhia, a Directoria convocará a Assembléa Geral.

Art. 43. A Assembléa Geral nomeará huma Commissão de tres Membros, pela fórma prescripta no Artigo 28, d'entre os Accionistas de trinta acções para cima, afim de proceder á liquidação da Companhia, com poderes para transigir sobre todas as contestações e demandas.

Art. 44. No fim de hum anno, ao mais tardar, a Commissão prestará suas contas á Assembléa Geral, apresentando hum inventario exacto da Companhia.

TITULO VIII

Disposições geraes

Art. 45. Alêm das duas mil acções que constituem o fundo da Companhia, se emittirão desde já mais cem acções, que pertencerão a Luiz Moretz Sohn, em remuneração de seus trabalhos e coadjuvação na realisação da idéa que fórma o objecto da empreza.

Ao possuidor das referidas cem acções ficão extensivos todos os direitos que os presentes Estatutos concedem aos demais Accionistas.

Art. 46. A Directoria fica autorisada a solicitar da Presidencia da Provincia do Rio de Janeiro hum privilegio para a sua linha de tansportes pelo tempo que for conveniente.

Art. 47. A Directoria arrendará os predios que forem necessarios para estações dos carros, estabelecimento commercial, depositos de generos, e tudo mais concernente ao objecto da Companhia, expedindo as convenientes ordens e instrucções para a economia e bom desempenho de todos os ramos de serviço.

Nos casos porêm de compra e edificação solicitará autorisação da Assembléa Geral, salvo havendo urgente necessidade, do que prestará conta na primeira reunião da Assembléa Geral.

Art. 48. No estabelecimento commercial não he permittido vender a credito com maior prazo do que o de tres mezes.

Art. 49. O maximo das despezas com comedorias do Gerente e mais empregados da Companhia será marcado em Regulamento especial da Directoria.

Art. 50. A Directoria fica autorisada a demandar e ser demandada, e a exercer livre e geral administração para o que lhe são conferidos plenos poderes, sem reserva alguma, inclusive os de procurador em causa propria.

Art. 51. Nos casos omissos nestes Estatutos se regulará a Companhia pelos que regem as Companhias de igual natureza legalmente estabelecidas, e pelos estylos por ellas seguidos, dando de tudo circunstanciada conta á Assembléa Geral em sua primeira reunião.

Art. 52. As contestações, que se suscitarem na marcha da administração, serão terminadas por meio de arbitros sempre que o possão ser.

Palacio do Rio de Janeiro em 25 de Outubro de 1854.

Luiz Pedreira do Coutto Ferraz.


REFERÊNCIA:

"Decreto nº 1464 de 25/10/1854". Diário Official do Império do Brasil. 1854, dezembro, 31.  


Marcelo Almirante
Página lançada em 10 de maio de 2018